sexta-feira, 19 de julho de 2013

QUEM VOCÊ SEGUE?





A Arte pode ser mais eloquente que o Vandalismo



(texto e desenho de Kau Mascarenhas)



Não apenas braços e armas, mas algumas vozes, pincéis e penas se movimentaram a favor da liberdade e da democracia em vários momentos da história da humanidade. 

Após ver na TV as cenas de destruição nas ruas cariocas, em mais uma noite de manifestação que havia começado pacificamente ontem, cheio de questionamentos, abri um livro. Sincronicamente, deitei o olhar na poesia de um escritor italiano cujo trabalho corajosamente enfrentou o manto cáustico do fascismo nos anos de 1930 e 1940. Seu nome era Carlo Alberto Salustri, mas assinava com o pseudônimo de Trilussa. O seu "Livro Mudo", lançado nos anos de Mussolini, demonstra sua bravura elegante e sua crítica ferina ao regime, e dele destaco o poema "Números": 

Eu valho muito pouco, sou sincero.
Dizia o Um ao Zero.
No entanto quanto vales tu? Na prática
és tão vazio e inconcludente 
quanto na matemática.
Ao passo que eu, se me coloco à frente
de cinco zeros bem iguais 
a ti, sabes acaso quanto fico?
Cem mil, meu caro, nem um tico
a menos, nem um tico a mais.
Questão de números. Aliás
é aquilo que sucede com todo ditador
que cresce em importância e tem valor
quanto mais são os zeros a segui-lo.

Os milhões que saíram para a rua pacificamente seguem seus corações e querem fazer algo para transformar o país.
E quem se está seguindo quando se destrói patrimônio público ou privado desmerecendo as legítimas e nobres manifestações que marcam historicamente esse momento da política brasileira?
Quem se segue quando se fere e suja um movimento tão belo, que mostra sua força na adesão de todas as camadas da sociedade, e no carinho feito de papel picado a chover dos prédios e de luzes em pisca-pisca pelas avenidas por onde passa?
Para mim as palavras de Trilussa foram como pedras atiradas àquela época exatamente em quem merecia.
A criatividade humana pode muito. Confio nisso. 
Por isso permaneço deixando meus dedos correrem pelo teclado para escrever e deslizarem pelo IPad para desenhar aquilo que considero uma forma de "baderna do Bem". 
É chato dar uma de politicamente correto, mas infelizmente para mim é a única forma de fazer uma revolução no atual estado de coisas e manter meus princípios pacifistas e humanistas.
E é assim que coloco meu cérebro a serviço das coisas em que acredito.
Percebo nas pessoas que se envolvem em quebra-quebras uma triste e paradoxal subserviência a tudo o que repudiamos no governo que nos oprime. 
Somos violentados e desrespeitados pelos impostos abusivos. A horda que destrói lojas faz o mesmo atingindo pais e mães de família que têm seus empregos ameaçados pelas consequências desses saques. 
Somos vilipendiados por decretos, PECs, e leis diversas, muitas delas votadas de forma secreta no Senado e no Congresso, e ficamos sem saber de quem é sua paternidade. Os mascarados que escondem o rosto enquanto queimam um ônibus com coquetel molotov agem de forma idêntica.
Somos apequenados pela terrível sensação de impotência ao pagar tantas taxas e termos zero-educação, zero-saúde e zero-segurança em retorno. Os bandos de poucos que se organizam para saquear e incendiar enfeiando o movimento, patrocinam a manutenção dessa realidade, pois fazem com que "protestar' seja associado a "destruir". Na verdade os milhões cansados de esperar saíram de suas casas para fazer o contrário: construir o país que sempre mereceram.
Trilussa nos lembra em seu poema que os "Uns" são inexpressivos, mas acompanhados de "Zeros" se tornam poderosos. 
Aqueles que não se informam, não leem, não pensam, acabam se tornando zeros, sem cérebro, sem poder deliberativo. 
E é bem possível que isso os leve a juntar-se justamente a quem insidiosamente conduza suas vidas e as de outros tantos a condições infelizes, das quais não será muito fácil se libertar.
Cegos pela ignorância, rumam para abismos de muito sofrimento seguindo outros cegos cujos cérebros estão a serviço apenas de si mesmos. 
Além de ocupar as ruas, tenha a arte como uma opção. 
Escreva, desenhe, pinte, cante, componha e una-se a quem busca soluções verdadeiramente pacíficas. 
Manifeste-se criativamente e dê forma concreta ao Brasil com o qual você sempre sonhou.

Nenhum comentário: